{ "@context": "https://schema.org/", "@graph": [ { "@type": "NewsArticle", "mainEntityOfPage": { "@type": "Webpage", "url": "/2024/02/12/a-guerra-na-ucrania-e-como-a-i-guerra-mundial-mas-com-drones-diz-combatente-estrangeiro" }, "headline": "\u0022A guerra na Ucr\u00e2nia \u00e9 como a I Guerra Mundial, mas com drones\u0022, diz combatente estrangeiro ", "description": "Bj\u00f8rn, das Ilhas Faro\u00e9, era pescador, mas agora \u00e9 \u0022viking\u0022 e combate na legi\u00e3o estrangeira ucraniana. Contou \u00e0 Euronews como foi o treino, a realidade na frente de combate, como se lesionou e porque quer continuar a lutar.", "articleBody": "H\u00e1 muito poucas pessoas com uma biografia t\u00e3o not\u00e1vel como a de Bj\u00f8rn. Nascido nas remotas Ilhas Faro\u00e9, um arquip\u00e9lago situado entre a Noruega, o Reino Unido e a Isl\u00e2ndia, come\u00e7ou a sua vida como pescador noutros pa\u00edses frios, incluindo a Gronel\u00e2ndia, e depois trabalhou na constru\u00e7\u00e3o civil nas Ilhas Faro\u00e9, onde nasceu. Mas essa era a sua vida antes da guerra da Ucr\u00e2nia. Agora est\u00e1 num bunker algures perto da linha da frente no leste da Ucr\u00e2nia, um dos poucos combatentes que conseguiu ar o intenso treino da legi\u00e3o estrangeira que, segundo ele, muitos, mesmo com treino militar anterior, n\u00e3o am. Como \u00e9 que ele chegou aqui exatamente? Combatente estrangeiro por acidente Bj\u00f8rn andava de mochila \u00e0s costas pela Europa quando recebeu um telefonema do seu primo, que tinha entrado para a Legi\u00e3o Estrangeira ucraniana logo no in\u00edcio daquilo a que a R\u00fassia ainda chamava uma \u0022opera\u00e7\u00e3o militar especial\u0022. \u0022Estivemos a falar durante mais de uma hora. Ele contou-me todas as atrocidades que os russos est\u00e3o a fazer contra os civis, contra as pessoas que trabalham no terreno, do grupo Wagner, e aqueles v\u00eddeos muito, muito gr\u00e1ficos\u0022, disse Bj\u00f8rn \u00e0 Euronews, acrescentando que sentia que n\u00e3o estava a fazer nada de \u00fatil no seu pa\u00eds, tendo-se despedido do seu emprego 12 dias antes, com um plano vago de voltar \u00e0 pesca. Os russos \u0022est\u00e3o a atacar edif\u00edcios civis, infra-estruturas civis, grupos de primeiros socorros. Est\u00e3o sempre a tentar quebrar o moral dos ucranianos\u0022, disseram-lhe. Bj\u00f8rn ficou impressionado e decidiu imediatamente juntar-se ao primo, que \u00e9 tamb\u00e9m seu afilhado. Apesar de o primo o ter tentado dissuadir, o ex-pescador viajou para a Ucr\u00e2nia, onde deveria submeter-se a um treino muito intenso no qual, segundo o pr\u00f3prio, 40% das pessoas n\u00e3o am. \u0022\u00c9 uma guerra diferente. N\u00e3o \u00e9 como o Iraque, o Afeganist\u00e3o ou qualquer outra guerra. \u00c9 como a Primeira Guerra Mundial, s\u00f3 que com drones. Estamos a correr por trincheiras. Fazemos caminhadas em bunkers. At\u00e9 os antigos soldados precisam de ser treinados de novo\u0022, diz ele, abanando a cabe\u00e7a. Apesar de ser um civil, Bj\u00f8rn seguiu um caminho que o levou a treinar com uma metralhadora. O treino f\u00edsico inicial durou tr\u00eas a quatro semanas e Bj\u00f8rn diz que perdeu 20 quilos em cinco semanas. 26 estagi\u00e1rios abandonaram a forma\u00e7\u00e3o a meio. Muitos dos civis sa\u00edram-se melhor do que muitos dos antigos soldados A forma\u00e7\u00e3o completa dura dois meses e os combatentes treinam com equipamento completo, usando coletes bal\u00edsticos que podem pesar at\u00e9 20 kg num calor de 26 graus. Para algu\u00e9m que nasceu num clima t\u00e3o frio, esta n\u00e3o foi uma tarefa f\u00e1cil. \u0022Vieram muitos homens. Entraram para a Legi\u00e3o e, ao fim de uma semana, diziam: \u0022Tenho oito anos de experi\u00eancia no ex\u00e9rcito, sou um ranger, um major, seja o que for\u0022, e depois abandonavam o treino, aparecendo muitas vezes \u0022feridos ou mortos\u0022, duas semanas depois. Bj\u00f8rn calcula que, dos recrutas que acabam por ir para a frente de batalha, 20% abandonam-na ap\u00f3s 2 a 5 miss\u00f5es, porque se apercebem de que \u0022a guerra \u00e9 um inferno\u0022. Alguns dos recrutas do lado ucraniano partem ao fim de quatro meses, depois de se aperceberem da realidade de estarem constantemente a ser bombardeados e de n\u00e3o conseguirem dormir. Faltavam cerca de dez dias para ser destacado e as minhas tr\u00eas primeiras miss\u00f5es foram extremamente dif\u00edceis Num ritual n\u00e3o oficial, os recrutas recebem alcunhas dos outros soldados quando se alistam. A de Bj\u00f8rn \u00e9 \u0022Viking\u0022, uma alus\u00e3o \u00e0 sua heran\u00e7a n\u00f3rdica e \u00e0 sua constitui\u00e7\u00e3o alta e forte. O seu melhor amigo, que ele diz ser t\u00e3o pr\u00f3ximo como o irm\u00e3o que nunca teve, chama-se Chipre, gra\u00e7as ao seu pa\u00eds natal. Atualmente, os dois s\u00e3o insepar\u00e1veis. Na primeira miss\u00e3o de Bj\u00f8rn, os recrutas s\u00f3 percorreram algumas centenas de metros antes de um drone lan\u00e7ar uma granada sobre a casa onde se encontravam e terem de caminhar tr\u00eas quil\u00f3metros at\u00e9 \u00e0 frente, onde continuaram a ser bombardeados. Sem o apoio a\u00e9reo ucraniano para defender os c\u00e9us com ca\u00e7as, a situa\u00e7\u00e3o faz lembrar as guerras do s\u00e9culo XX. \u0022S\u00f3 queria ir para casa\u0022, diz Bj\u00f8rn sobre as suas primeiras miss\u00f5es. Mas perseverou e come\u00e7ou a habituar-se aos estrondos de artilharia, morteiros, RPGs e todos os outros tipos de explos\u00f5es. Ele explicou que quando se consegue distinguir estes sons, fica-se mais calmo, porque se sabe como reagir. Mas algumas miss\u00f5es mais tarde, Bj\u00f8rn foi ferido. O inferno come\u00e7ou e os dois rapazes foram apanhados na linha de fogo Bj\u00f8rn estava numa miss\u00e3o de reconhecimento, para ver o que os soldados russos estavam a fazer nos seus bunkers. Diz que, devido \u00e0s condi\u00e7\u00f5es do terreno, n\u00e3o se tratava de rastejar metros entre trincheiras, mas sim de nadar. Mas, de repente, ouviu uma bala. Dez minutos depois, iniciou-se um intenso tiroteio. \u0022Foi o maior n\u00famero de RPGs que vi desde que entrei para a guerra\u0022, disse Bj\u00f8rn. \u0022A certa altura, vi que o meu bunker da frente estava em apuros.\u0022 Bj\u00f8rn estava a defender os seus companheiros de equipa do grande n\u00famero de RPGs, atiradores furtivos e metralhadoras com fogo de supress\u00e3o, quando ouviu o som de um RPG a perfurar a sua armadura. Descreve o r\u00e1pido estalido destas granadas. \u0022Fazem duas explos\u00f5es do g\u00e9nero 'thun-thun'. A primeira \u00e9 para romper a armadura e a segunda \u00e9 para matar o que estiver l\u00e1 dentro. E eu ouvi a primeira explos\u00e3o, 'boom', e pensei, 'oh raios, foi por pouco'. E depois a segunda atingiu-me.\u0022 Bj\u00f8rn foi atirado com tanta for\u00e7a que, quando bateu na parede, o seu corpo deixou uma marca nos sacos de areia. Desmaiou durante 10 segundos. Quando voltou a si, uma nuvem de poeira e fumo t\u00e3o espessa cobria-lhe as pernas. Agarrou-se \u00e0 arma, que conseguiu apanhar no ch\u00e3o. Percebeu imediatamente que algo estava errado. \u0022Tinha levado uma das m\u00e3os \u00e0 cara para ver que estava ferido e a sangrar.\u0022 Foi atingido por estilha\u00e7os de 1 mm a 1,5 mm no tronco, bra\u00e7os e pernas. A sua arma tamb\u00e9m n\u00e3o sobreviveu e foi atingida por estilha\u00e7os. \u0022N\u00e3o conseguia ver nada. Apesar disso, ainda conseguiu correr 15 metros para escapar ao fumo, onde tentou aplicar um torniquete. As duas m\u00e3os estavam t\u00e3o feridas que n\u00e3o conseguiu torcer o material \u00e0 volta da ferida para estancar a hemorragia. Ningu\u00e9m vai para Valhalla, n\u00e3o desta vez Felizmente, dois dos seus camaradas, incluindo Chipre, vieram em seu aux\u00edlio e conseguiram aplicar o torniquete com sucesso. No entanto, quando Bj\u00f8rn olhou para baixo, reparou que havia muito sangue concentrado \u00e0 volta da virilha. Temeu o pior. \u0022Chipre, verifica\u0022, diz Bj\u00f8rn, gritando a Chipre. \u0022N\u00e3o, n\u00e3o, Viking, tenho de estancar a hemorragia\u0022, respondeu o seu camarada, tratando dos seus outros ferimentos. Bj\u00f8rn tamb\u00e9m estava a sangrar do lado. Os dois come\u00e7aram a gritar um com o outro, diz Bj\u00f8rn, discutindo sobre o que era mais urgente fazer. Depois de muita discuss\u00e3o, Chipre e outro soldado que ouviu toda a confus\u00e3o despiram Bj\u00f8rn e examinaram a \u00e1rea. O tempo p\u00e1ra at\u00e9 Chipre voltar a levantar os dois polegares e lhe dar as boas not\u00edcias. O tiroteio recome\u00e7ou e Chipre e os seus camaradas deixaram Bj\u00f8rn e a sua arma partida no t\u00fanel para irem combater. Bj\u00f8rn diz que come\u00e7ou a gritar sobre Valhalla. Mas a adrenalina \u00e9 uma droga potente. Bj\u00f8rn n\u00e3o se lembra de nenhuma dor do incidente. Demorou dois dias a senti-la. Entretanto, recuperou 80% da sensibilidade do bra\u00e7o ap\u00f3s um transplante de nervo para um dos dedos e v\u00e1rios meses num hospital. Dentro de tr\u00eas a cinco meses saber\u00e1 se voltar\u00e1 a ter todas as fun\u00e7\u00f5es e sensa\u00e7\u00f5es. A realidade na linha da frente Bj\u00f8rn diz que muitos dos soldados russos n\u00e3o s\u00e3o apenas muito jovens, mas que n\u00e3o t\u00eam armadura nem capacetes. Muitos deles s\u00e3o inexperientes e, quando enviados para a frente, acabam por se perder antes de trope\u00e7arem nos soldados ucranianos. \u0022Normalmente usam estes tipos, enviam-nos para a frente, cavam trincheiras, coisas desse g\u00e9nero. Estes tipos costumam levar um tiro e, quando finalmente acabam, s\u00e3o os profissionais que v\u00e3o \u00e0 luta\u0022. \u00c9 muito f\u00e1cil distinguir entre p\u00e1ra-quedistas e recrutas, diz ele, porque \u0022os recrutas s\u00e3o muito cobardes. Come\u00e7am a disparar a 80 ou 100 metros de dist\u00e2ncia\u0022 \u00e0s cegas e com medo. Mas os p\u00e1ra-quedistas e os soldados profissionais com mais experi\u00eancia s\u00e3o muito agressivos. Bj\u00f8rn fala tamb\u00e9m dos territ\u00f3rios ocupados. Revelou que em muitos locais, incluindo Bakhmut, os soldados russos mantinham os residentes como ref\u00e9ns para os usar como escudos humanos \u0022porque sabiam que os ucranianos n\u00e3o iam disparar\u0022. O seu pr\u00f3prio batalh\u00e3o encontrou provas de valas comuns com \u0022todos os sinais de execu\u00e7\u00e3o\u0022, que ele acredita terem sido perpetradas pelo grupo Wagner. Ele pr\u00f3prio diz ter visto v\u00eddeos (que n\u00e3o puderam ser verificados de forma independente pela Euronews) de mulheres a serem violadas em grupo e de mulheres e crian\u00e7as a serem alvejadas por um tanque. Mas tende a evitar estes v\u00eddeos gr\u00e1ficos sempre que pode. \u0022Estou a lutar por uma boa causa\u0022 Bjorn diz que a sua motiva\u00e7\u00e3o para regressar \u00e0 frente de batalha \u00e9 o seu profundo respeito pelo povo ucraniano, que continua a perseverar mesmo perante tais atrocidades. Bj\u00f8rn diz tamb\u00e9m que os soldados russos \u0022destroem tudo\u0022, incluindo aldeias perto da fronteira com apenas 20 habitantes, porque est\u00e3o determinados a erradicar tudo o que \u00e9 ucraniano. \u0022Se perderem, nunca mais se poder\u00e3o chamar ucranianos e isso \u00e9 algo que a R\u00fassia quer\u0022, afirma. Bj\u00f8rn acrescenta que sente que est\u00e1 a lutar por uma causa justa, \u0022o que \u00e9 muito raro hoje em dia\u0022. No seu pa\u00eds, os ucranianos n\u00e3o se consideram parte da R\u00fassia, facto que a R\u00fassia utiliza frequentemente para justificar a guerra, a menos que 250 anos de genoc\u00eddio e ocupa\u00e7\u00e3o sejam considerados uma reivindica\u00e7\u00e3o hist\u00f3rica. \u0022\u00c9 muito estranho que as pessoas ainda acreditem que a R\u00fassia est\u00e1 a lutar contra os nazis. Zelenskyy \u00e9 judeu, o primeiro-ministro \u00e9 judeu. O ministro da defesa \u00e9 mu\u00e7ulmano. H\u00e1 aqui 20 grupos \u00e9tnicos e 30 l\u00ednguas diferentes. \u00c9 tudo exceto o nazismo\u0022. Bj\u00f8rn simpatiza com os ucranianos e estabelece semelhan\u00e7as entre a Ucr\u00e2nia e o seu pa\u00eds natal, as Ilhas Faro\u00e9, que s\u00f3 se tornaram independentes da Dinamarca em 1948. A guerra ensina-nos a apreciar as pequenas coisas da vida Bj\u00f8rn diz que, durante a guerra, aprendeu a apreciar as pequenas coisas da vida. \u0022Antes detestava ir a uma pe\u00e7a de teatro para crian\u00e7as, mas no futuro vou ar a gostar delas. Agora comovo-me facilmente por dentro... Antes da guerra, eu era um viciado em trabalho, mas agora sou um soldado que aprecia os pequenos pormenores da vida\u0022, ri-se. Quando a guerra acabar, planeia assistir \u00e0 erup\u00e7\u00e3o de um vulc\u00e3o island\u00eas com o seu filho de 14 anos. Jura que o seu batalh\u00e3o est\u00e1 determinado a que os russos n\u00e3o ultraem as suas linhas de defesa at\u00e9 \u00e0 cidade que est\u00e3o a defender. Est\u00e1 empenhado em proteger os civis da cidade. Mas n\u00e3o \u00e9 f\u00e1cil. Bj\u00f8rn acredita que est\u00e3o a ser travadas duas guerras em simult\u00e2neo - a guerra real e uma guerra medi\u00e1tica - e que a propaganda russa sobre a vit\u00f3ria da R\u00fassia est\u00e1 muito longe da realidade. \u0022Desde que Putin come\u00e7ou esta guerra com a Ucr\u00e2nia para travar a NATO, a R\u00fassia ficou cercada pela NATO\u0022, diz Bjorn, que acredita que o Presidente Putin est\u00e1 apenas a tentar salvar a face. N\u00e3o acredita que a guerra termine t\u00e3o cedo. Putin tem de ser travado \u0022Se n\u00e3o se travar a R\u00fassia aqui, nesta frente, isto \u00e9 mesmo ao lado de uma fronteira europeia\u0022, avisa, apontando para a hist\u00f3ria recente da R\u00fassia, incluindo a Crimeia, a Ge\u00f3rgia e a Chech\u00e9nia. O seu maior receio \u00e9 uma guerra nuclear, mas insiste que, depois da guerra, \u0022toda a gente tem de se sentar e falar sobre estas armas nucleares e sobre a raz\u00e3o pela qual alguns pa\u00edses t\u00eam tantas coisas que podem destruir metade do mundo. Eu tenho 40 anos e j\u00e1 quase tive tr\u00eas guerras nucleares na minha vida\u0022. \u0022Gostaria que, depois desta guerra, tiv\u00e9ssemos 100 anos de paz, consolidando as nossas universidades, a ci\u00eancia, a medicina... s\u00f3 por uma vez. Acho que toda a gente est\u00e1 cansada da guerra\u0022, lamenta. Mas, por agora, Bj\u00f8rn est\u00e1 ansioso por regressar a casa depois da guerra. Ele diz que as Ilhas Faro\u00e9 s\u00e3o um para\u00edso. O que \u00e9 que nos ajuda a mantermo-nos humanos aqui na frente? Bj\u00f8rn diz que \u0022se n\u00e3o fosse o vosso apoio, n\u00e3o ser\u00edamos t\u00e3o fortes durante tanto tempo\u0022. Bj\u00f8rn agradece especialmente aos doadores privados que ajudaram a enviar ve\u00edculos blindados, carros pessoais que utilizam para o transporte, o que \u00e9 muito, muito significativo, porque as estradas na Ucr\u00e2nia est\u00e3o muito, muito bem agora, lamacentas e m\u00e1s\u0022. Acho que o que nos mant\u00e9m humanos na frente e n\u00e3o apenas carne para canh\u00e3o \u00e9 saber que por tr\u00e1s de n\u00f3s existem pessoas civis que se preocupam com o nosso bem-estar, com a nossa alimenta\u00e7\u00e3o, com o nosso calor no inverno, com o nosso caf\u00e9, com a nossa comida, com os nossos doces. O sentimento de que somos apreciados e n\u00e3o estamos sozinhos. Se quiser fazer um donativo, pode faz\u00ea-lo aqui. 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"A guerra na Ucrânia é como a I Guerra Mundial, mas com drones", diz combatente estrangeiro

O "Viking" durante uma das suas missões na frente de combate na Ucrânia.
O "Viking" durante uma das suas missões na frente de combate na Ucrânia. Direitos de autor The "Viking"
Direitos de autor The "Viking"
De Olivia Stroud and Lena Roche
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Bjørn, das Ilhas Faroé, era pescador, mas agora é "viking" e combate na legião estrangeira ucraniana. Contou à Euronews como foi o treino, a realidade na frente de combate, como se lesionou e porque quer continuar a lutar.

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Há muito poucas pessoas com uma biografia tão notável como a de Bjørn. Nascido nas remotas Ilhas Faroé, um arquipélago situado entre a Noruega, o Reino Unido e a Islândia, começou a sua vida como pescador noutros países frios, incluindo a Gronelândia, e depois trabalhou na construção civil nas Ilhas Faroé, onde nasceu. Mas essa era a sua vida antes da guerra da Ucrânia. Agora está num bunker algures perto da linha da frente no leste da Ucrânia, um dos poucos combatentes que conseguiu ar o intenso treino da legião estrangeira que, segundo ele, muitos, mesmo com treino militar anterior, não am. Como é que ele chegou aqui exatamente?

Combatente estrangeiro por acidente

Bjørn andava de mochila às costas pela Europa quando recebeu um telefonema do seu primo, que tinha entrado para a Legião Estrangeira ucraniana logo no início daquilo a que a Rússia ainda chamava uma "operação militar especial".

"Estivemos a falar durante mais de uma hora. Ele contou-me todas as atrocidades que os russos estão a fazer contra os civis, contra as pessoas que trabalham no terreno, do grupo Wagner, e aqueles vídeos muito, muito gráficos", disse Bjørn à Euronews, acrescentando que sentia que não estava a fazer nada de útil no seu país, tendo-se despedido do seu emprego 12 dias antes, com um plano vago de voltar à pesca.

Os russos "estão a atacar edifícios civis, infra-estruturas civis, grupos de primeiros socorros. Estão sempre a tentar quebrar o moral dos ucranianos", disseram-lhe. Bjørn ficou impressionado e decidiu imediatamente juntar-se ao primo, que é também seu afilhado.

Apesar de o primo o ter tentado dissuadir, o ex-pescador viajou para a Ucrânia, onde deveria submeter-se a um treino muito intenso no qual, segundo o próprio, 40% das pessoas não am.

"É uma guerra diferente. Não é como o Iraque, o Afeganistão ou qualquer outra guerra. É como a Primeira Guerra Mundial, só que com drones. Estamos a correr por trincheiras. Fazemos caminhadas em bunkers. Até os antigos soldados precisam de ser treinados de novo", diz ele, abanando a cabeça.

In the Foreign Legion everyone is being given a nickname.
In the Foreign Legion everyone is being given a nickname.The "Viking"

Apesar de ser um civil, Bjørn seguiu um caminho que o levou a treinar com uma metralhadora.

O treino físico inicial durou três a quatro semanas e Bjørn diz que perdeu 20 quilos em cinco semanas. 26 estagiários abandonaram a formação a meio.

Muitos dos civis saíram-se melhor do que muitos dos antigos soldados

A formação completa dura dois meses e os combatentes treinam com equipamento completo, usando coletes balísticos que podem pesar até 20 kg num calor de 26 graus. Para alguém que nasceu num clima tão frio, esta não foi uma tarefa fácil.

"Vieram muitos homens. Entraram para a Legião e, ao fim de uma semana, diziam: "Tenho oito anos de experiência no exército, sou um ranger, um major, seja o que for", e depois abandonavam o treino, aparecendo muitas vezes "feridos ou mortos", duas semanas depois. Bjørn calcula que, dos recrutas que acabam por ir para a frente de batalha, 20% abandonam-na após 2 a 5 missões, porque se apercebem de que "a guerra é um inferno".

Alguns dos recrutas do lado ucraniano partem ao fim de quatro meses, depois de se aperceberem da realidade de estarem constantemente a ser bombardeados e de não conseguirem dormir.

Faltavam cerca de dez dias para ser destacado e as minhas três primeiras missões foram extremamente difíceis

Num ritual não oficial, os recrutas recebem alcunhas dos outros soldados quando se alistam. A de Bjørn é "Viking", uma alusão à sua herança nórdica e à sua constituição alta e forte. O seu melhor amigo, que ele diz ser tão próximo como o irmão que nunca teve, chama-se Chipre, graças ao seu país natal. Atualmente, os dois são inseparáveis.

Na primeira missão de Bjørn, os recrutas só percorreram algumas centenas de metros antes de um drone lançar uma granada sobre a casa onde se encontravam e terem de caminhar três quilómetros até à frente, onde continuaram a ser bombardeados. Sem o apoio aéreo ucraniano para defender os céus com caças, a situação faz lembrar as guerras do século XX.

"Só queria ir para casa", diz Bjørn sobre as suas primeiras missões. Mas perseverou e começou a habituar-se aos estrondos de artilharia, morteiros, RPGs e todos os outros tipos de explosões. Ele explicou que quando se consegue distinguir estes sons, fica-se mais calmo, porque se sabe como reagir.

The "Viking" after a mission at the front in Ukraine.
The "Viking" after a mission at the front in Ukraine.The "Viking"

Mas algumas missões mais tarde, Bjørn foi ferido.

O inferno começou e os dois rapazes foram apanhados na linha de fogo

Bjørn estava numa missão de reconhecimento, para ver o que os soldados russos estavam a fazer nos seus bunkers. Diz que, devido às condições do terreno, não se tratava de rastejar metros entre trincheiras, mas sim de nadar. Mas, de repente, ouviu uma bala.

Dez minutos depois, iniciou-se um intenso tiroteio. "Foi o maior número de RPGs que vi desde que entrei para a guerra", disse Bjørn.

"A certa altura, vi que o meu bunker da frente estava em apuros." Bjørn estava a defender os seus companheiros de equipa do grande número de RPGs, atiradores furtivos e metralhadoras com fogo de supressão, quando ouviu o som de um RPG a perfurar a sua armadura. Descreve o rápido estalido destas granadas.

"Fazem duas explosões do género 'thun-thun'. A primeira é para romper a armadura e a segunda é para matar o que estiver lá dentro. E eu ouvi a primeira explosão, 'boom', e pensei, 'oh raios, foi por pouco'. E depois a segunda atingiu-me."

Bjørn foi atirado com tanta força que, quando bateu na parede, o seu corpo deixou uma marca nos sacos de areia.

Desmaiou durante 10 segundos. Quando voltou a si, uma nuvem de poeira e fumo tão espessa cobria-lhe as pernas. Agarrou-se à arma, que conseguiu apanhar no chão. Percebeu imediatamente que algo estava errado.

The "Viking" was injured.
The "Viking" was injured.the "Viking"

"Tinha levado uma das mãos à cara para ver que estava ferido e a sangrar." Foi atingido por estilhaços de 1 mm a 1,5 mm no tronco, braços e pernas. A sua arma também não sobreviveu e foi atingida por estilhaços.

"Não conseguia ver nada. Apesar disso, ainda conseguiu correr 15 metros para escapar ao fumo, onde tentou aplicar um torniquete. As duas mãos estavam tão feridas que não conseguiu torcer o material à volta da ferida para estancar a hemorragia.

Ninguém vai para Valhalla, não desta vez

Felizmente, dois dos seus camaradas, incluindo Chipre, vieram em seu auxílio e conseguiram aplicar o torniquete com sucesso.

No entanto, quando Bjørn olhou para baixo, reparou que havia muito sangue concentrado à volta da virilha. Temeu o pior. "Chipre, verifica", diz Bjørn, gritando a Chipre.

"Não, não, Viking, tenho de estancar a hemorragia", respondeu o seu camarada, tratando dos seus outros ferimentos. Bjørn também estava a sangrar do lado. Os dois começaram a gritar um com o outro, diz Bjørn, discutindo sobre o que era mais urgente fazer. Depois de muita discussão, Chipre e outro soldado que ouviu toda a confusão despiram Bjørn e examinaram a área. O tempo pára até Chipre voltar a levantar os dois polegares e lhe dar as boas notícias.

O tiroteio recomeçou e Chipre e os seus camaradas deixaram Bjørn e a sua arma partida no túnel para irem combater. Bjørn diz que começou a gritar sobre Valhalla.

Mas a adrenalina é uma droga potente. Bjørn não se lembra de nenhuma dor do incidente. Demorou dois dias a senti-la. Entretanto, recuperou 80% da sensibilidade do braço após um transplante de nervo para um dos dedos e vários meses num hospital. Dentro de três a cinco meses saberá se voltará a ter todas as funções e sensações.

A realidade na linha da frente

Bjørn diz que muitos dos soldados russos não são apenas muito jovens, mas que não têm armadura nem capacetes. Muitos deles são inexperientes e, quando enviados para a frente, acabam por se perder antes de tropeçarem nos soldados ucranianos.

"Normalmente usam estes tipos, enviam-nos para a frente, cavam trincheiras, coisas desse género. Estes tipos costumam levar um tiro e, quando finalmente acabam, são os profissionais que vão à luta".

É muito fácil distinguir entre pára-quedistas e recrutas, diz ele, porque "os recrutas são muito cobardes. Começam a disparar a 80 ou 100 metros de distância" às cegas e com medo.

Mas os pára-quedistas e os soldados profissionais com mais experiência são muito agressivos.

Bjørn fala também dos territórios ocupados. Revelou que em muitos locais, incluindo Bakhmut, os soldados russos mantinham os residentes como reféns para os usar como escudos humanos "porque sabiam que os ucranianos não iam disparar".

O seu próprio batalhão encontrou provas de valas comuns com "todos os sinais de execução", que ele acredita terem sido perpetradas pelo grupo Wagner. Ele próprio diz ter visto vídeos (que não puderam ser verificados de forma independente pela Euronews) de mulheres a serem violadas em grupo e de mulheres e crianças a serem alvejadas por um tanque. Mas tende a evitar estes vídeos gráficos sempre que pode.

"Estou a lutar por uma boa causa"

Bjorn diz que a sua motivação para regressar à frente de batalha é o seu profundo respeito pelo povo ucraniano, que continua a perseverar mesmo perante tais atrocidades.

The "Viking" before going on a mission.
The "Viking" before going on a mission.The "Viking"

Bjørn diz também que os soldados russos "destroem tudo", incluindo aldeias perto da fronteira com apenas 20 habitantes, porque estão determinados a erradicar tudo o que é ucraniano.

"Se perderem, nunca mais se poderão chamar ucranianos e isso é algo que a Rússia quer", afirma.

Bjørn acrescenta que sente que está a lutar por uma causa justa, "o que é muito raro hoje em dia". No seu país, os ucranianos não se consideram parte da Rússia, facto que a Rússia utiliza frequentemente para justificar a guerra, a menos que 250 anos de genocídio e ocupação sejam considerados uma reivindicação histórica.

"É muito estranho que as pessoas ainda acreditem que a Rússia está a lutar contra os nazis. Zelenskyy é judeu, o primeiro-ministro é judeu. O ministro da defesa é muçulmano. Há aqui 20 grupos étnicos e 30 línguas diferentes. É tudo exceto o nazismo".

Bjørn simpatiza com os ucranianos e estabelece semelhanças entre a Ucrânia e o seu país natal, as Ilhas Faroé, que só se tornaram independentes da Dinamarca em 1948.

A guerra ensina-nos a apreciar as pequenas coisas da vida

Bjørn diz que, durante a guerra, aprendeu a apreciar as pequenas coisas da vida.

"Antes detestava ir a uma peça de teatro para crianças, mas no futuro vou ar a gostar delas. Agora comovo-me facilmente por dentro... Antes da guerra, eu era um viciado em trabalho, mas agora sou um soldado que aprecia os pequenos pormenores da vida", ri-se. Quando a guerra acabar, planeia assistir à erupção de um vulcão islandês com o seu filho de 14 anos.

The "Viking" wearing his hand knitted jumper from the Faroe Islands at the front in Ukraine.
The "Viking" wearing his hand knitted jumper from the Faroe Islands at the front in Ukraine.the "Viking"

Jura que o seu batalhão está determinado a que os russos não ultraem as suas linhas de defesa até à cidade que estão a defender. Está empenhado em proteger os civis da cidade.

Mas não é fácil. Bjørn acredita que estão a ser travadas duas guerras em simultâneo - a guerra real e uma guerra mediática - e que a propaganda russa sobre a vitória da Rússia está muito longe da realidade.

"Desde que Putin começou esta guerra com a Ucrânia para travar a NATO, a Rússia ficou cercada pela NATO", diz Bjorn, que acredita que o Presidente Putin está apenas a tentar salvar a face. Não acredita que a guerra termine tão cedo.

Putin tem de ser travado

"Se não se travar a Rússia aqui, nesta frente, isto é mesmo ao lado de uma fronteira europeia", avisa, apontando para a história recente da Rússia, incluindo a Crimeia, a Geórgia e a Chechénia.

O seu maior receio é uma guerra nuclear, mas insiste que, depois da guerra, "toda a gente tem de se sentar e falar sobre estas armas nucleares e sobre a razão pela qual alguns países têm tantas coisas que podem destruir metade do mundo. Eu tenho 40 anos e já quase tive três guerras nucleares na minha vida".

"Gostaria que, depois desta guerra, tivéssemos 100 anos de paz, consolidando as nossas universidades, a ciência, a medicina... só por uma vez. Acho que toda a gente está cansada da guerra", lamenta.

Mas, por agora, Bjørn está ansioso por regressar a casa depois da guerra. Ele diz que as Ilhas Faroé são um paraíso.

The "Viking" back home in the Faore Islands.
The "Viking" back home in the Faore Islands.The "Viking"

O que é que nos ajuda a mantermo-nos humanos aqui na frente?

Bjørn diz que "se não fosse o vosso apoio, não seríamos tão fortes durante tanto tempo". Bjørn agradece especialmente aos doadores privados que ajudaram a enviar veículos blindados, carros pessoais que utilizam para o transporte, o que é muito, muito significativo, porque as estradas na Ucrânia estão muito, muito bem agora, lamacentas e más".

Acho que o que nos mantém humanos na frente e não apenas carne para canhão é saber que por trás de nós existem pessoas civis que se preocupam com o nosso bem-estar, com a nossa alimentação, com o nosso calor no inverno, com o nosso café, com a nossa comida, com os nossos doces. O sentimento de que somos apreciados e não estamos sozinhos.

Se quiser fazer um donativo, pode fazê-lo aqui.

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